segunda-feira, 21 de novembro de 2016
Sonho
A sombra cega-me teu olhar
Nela contido,
Contigo a noite guarda segredos
Do corpo despido.
O teu corpo é alma cega
De um sonho quente,
Entre fumos e noite calma.
Fecho-me no túmulo de fogo oculto,
E a lua de amor velado
É a noite do grande vulto
Que se perde no teu sonho libertado.
P.A.
segunda-feira, 7 de novembro de 2016
Sem nome
Quero dizer-te o avesso das palavras
porque assim coincide o mundo
nas ilações nocturnas.
O que me alegra e entristece,
exaspera ou consola,
é a linguagem do corpo
que se move com excepção,
a estranha comunicação
que se distancia do discurso
para se infiltrar na alma
que não se encontra.
Não posso escapar-lhes é certo,
mas certo é que elas, as palavras,
escapam ao mais ínfimo filamento carnal
para acabar em silêncio.
O que quero dizer-te são coisas sem nome,
puras nas palavras que não escutei.
Hoje uma árvore que assim não se chama,
amanhã um beijo inocente e insignificante,
sem o invólucro do intelecto, porque não leio em ti
senão a bravura e consagração
da presença captada no começo
dos nomes que não demos.
Quero dizer-te o que existe
sem palavras certas,
a liberdade desacertada do espírito
num corpo vendado à dependência dos nomes,
o que se toca e chama no clamor
permanente das formas.
Não posso escapar-lhes é certo,
mas certo é que elas, as palavras,
me negam para sempre
a plenitude das causas.
P.A.
sexta-feira, 4 de novembro de 2016
Regresso
Regresso a um tempo cessante
que se colhe de parecenças,
um sabor tépido inebriante
move-se pelas coisas extensas
que se anunciam a par de viver
a verdade de estar admirado
quando admirar é não dizer.
Regresso a um espaço ileso
que ascende ao momento constante,
aroma incidente e indefeso
que arde no presente dilacerante
em que se solta o eixo consciente
e uma vontade suspensa
do invisível tão evidente
Quando admirar é a verdade imensa
Regresso no fio que encarna
o riso de um apelo impreciso
e pequeno choro aleatório,
sinto o momento obrigatório
como um estranho caminhando
em outro lugar, procurando
o batimento que em mim
se desloca por fim
a mitigar o presente
quando a admiração não mente.
P.A.
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