sábado, 18 de setembro de 2010

Fim de Férias


Acabaram as férias, espaço e tempo edílicos, produzidos artificialmente nas mentes em oposição à organização exaustiva do trabalho compulsivo. Todos já percebemos que as férias podem tornar-se uma dor de cabeça e uma fonte de stress, com repercussões no bem-estar das famílias, e porquê? Porque não há organização do tempo, porque se juntam todos os desocupados em torno do desejo de fuga. E todos querem fugir ao mesmo tempo, largar as amarras do tempo obrigatório e correr em todos os caminhos, estar em todos os lugares à mesma hora (por volta das sete da manhã), cansar-se como animais na livre arena dos dias pendentes. É difícil hoje escapar à tendência de aceleração do ritmo de retenção dos prazeres, da reorganização do tempo alternativo e programado segundo uma avidez atafulhada de encontros desencontrados com a rotina. Também me incluo no grupo daqueles que procuram programas, mais ou menos organizados, para estar em todos os lugares à mesma hora, sorver-lhes o âmago temporário e voltar confortado com restos colados à pele. Mas confesso, que também me incluo no grupo daqueles que encontram o máximo de prazer na leitura do jornal numa mesa de café, por tempo indeterminado, até que este pasme sobre a certeza das coisas. É quase sempre assim, conciliar estes dois mundos, sem uma acesa discussão familiar, é uma virtude respeitável em tempo de férias. Tudo desemboca na justificação comum de que são os efeitos da globalização, os quais, mesmo em tempo de férias, não deixam de promover a aceleração do ritmo vital, como um produto em movimento acabado para não deixar as mentes adormecerem na fixação de uma realidade adquirida. O processo de globalização significa uma mudança, como afirma Manuel Castells, "de um mundo de lugares para um mundo de fluxos". Face a esta nova reorganização do espaço e do tempo, os moldes de integração em tempo de férias, dantes idealizados, podem já não funcionar para grandes grupos. É preciso circular em grande velocidade, em todas as direcções, mesmo que virtualmente, sempre pela necessidade de que os diversos fluxos alimentarão novas necessidades, umas que se materializarão em prazeres concretos, outras que se assumirão, elas próprias, como uma realidade volátil, desmaterializada por feixes contínuos entre extremidades longínquas. Por agora, de regresso ao trabalho, quero apenas fixar-me numa paisagem concreta e palpável, que me assegura a existência e o prazer de estar a participar numa presença material, e não no vazio organizado virtualmente, aquele que percorre sem parar todos os lugares ao mesmo tempo.


P.A.




3 comentários:

Anónimo disse...

Paulo

Já tinha pensado várias vezes em algumas das questões que abordas neste texto, porque são várias questões, sem dúvida nenhuma!Por exemplo a necessidade constante de pensar nas férias como recompensa após um ano de trabalho, o pensar que nessa altura sim, virá a paz e a serenidade; A "ilusão" de que aí sim, tudo será diferente... .
Vivemos sempre à espera do bem estar que ainda há-de chegar, vivemos sempre à espera, e assim vamos perdendo a experiência da intensidade do Agora, que com algum esforço e alguma sabedoria
nos pode ir trazendo a felicidade possível, não a ideal, mas a possível!

1 beijo grande :)

Helena disse...

Paulo

Quem me dera essa praia, essas dunas, esse mar... . Que saudades tenho eu já das férias e tu dizer mal delas ;).
Fotografia espetacular, como sempre!

1 beijinho

Sara disse...

Sérgio

Ainda bem que acabaram as férias! Já sentia saudades das rotinas securizantes do dia-a-dia... . No fundo, precisamos sempre de regressar aos braços da paz e da serenidade que nos proprocionam os caminhos trilhados desde sempre,sempre de mãos dadas com as mãos que seguramos nas nossas...

Um beijo