“A pergunta permanece; e qualquer resposta que converta o indivíduo numa função do processo histórico-sociológico, assinalando-lhe só uma tarefa de serviço no progresso da humanidade, levanta-se no fundo (tendo origem na essência humana) uma rebelião da existência individual pessoal”
Emerich Coreth “O que é o Homem?”
O entardecer um dia sepulta-nos numa disputa de contracções contempladas na vertigem da morte. Repente que subleva o sentido das palavras numa imagem estropiada de todos os rumos imperfeitos. Somos chamados pelo fim dos outros a aprofundar o lugar da nossa existência, paradigma de uma presença interrogada, intuição sobre os fundamentos do ser para além da história dos homens, a morte como construção interior dum sentido sempre começado. Vivemos esquecidos num tempo eterno até sentirmos por momentos a ordem das coisas ser ultrapassada na consciência, que nos suspende numa agonia irrefutável, num apelo interdito entre a presença e a não presença, entre o ser e o não ser, fronteira que abandonamos pelo esquecimento conveniente, reconfigurado na ilusão dos dias e necessidade de continuarmos a ventilar o ar pesado que se abate pela espera incontornável do fim, para prosseguirmos no paradoxo entre a presença e a sua impossibilidade no tempo. A morte é uma ultrapassagem, antevisão fundamental que se retrai pela explosão do tempo consciente. Se por um lado todos os caminhos estão iluminados na sua validade e valoração perante o fim, são eles inconciliáveis com a sua interrupção eterna, que se abate pelo desfasamento da medida contínua das acções quotidianas, numa ameaçada racional e intrusa no curso individual e intransmissível. A morte é o destino de todos os homens, mas o destino dos homens não se reduz ao seu processo histórico e social, à sua função útil e finalidade colectiva, à maquinação dos desejos e quantificação dos gestos. Homem social e homem individual confrontam-se no avanço quotidiano repercutido no empenho e abandono vividos num processo de descontinuidade sentimental. Empenho e abandono são a síntese do processo existencial no tempo formador que impõe a realização alternada do “ser para morte”. Morrer no curso da existência é a garantia da finalidade humana, cumprida pelo aprofundamento da essência particular. Não é uma função biológica ou social, é uma pausa reflexiva que revela a unicidade individual e incomunicável, é uma morte relativa e provisória perante o final de uma etapa que sabemos acontecer um dia, e diante o qual resistimos intermitentes, dando conta do absurdo confronto entre a historicidade do ser e a sua superação pelo fim. Sem a morte as vivências percorreriam provavelmente um espaço vazio e infinito na falta de atrito temporal imposto por esse mesmo fim formador. Morremos essencialmente para continuarmos a pertencer às coisas na sua novidade. Morremos temporariamente no curso da existência como condição de revelação da essência impressa num código para além da história factual. É um lugar inefável onde se alcança a realidade inominada em sentido regressivo, que apaga os vícios da espécie e reinicia o fecundo e ingénuo desconhecimento.
P.A.
Emerich Coreth “O que é o Homem?”
O entardecer um dia sepulta-nos numa disputa de contracções contempladas na vertigem da morte. Repente que subleva o sentido das palavras numa imagem estropiada de todos os rumos imperfeitos. Somos chamados pelo fim dos outros a aprofundar o lugar da nossa existência, paradigma de uma presença interrogada, intuição sobre os fundamentos do ser para além da história dos homens, a morte como construção interior dum sentido sempre começado. Vivemos esquecidos num tempo eterno até sentirmos por momentos a ordem das coisas ser ultrapassada na consciência, que nos suspende numa agonia irrefutável, num apelo interdito entre a presença e a não presença, entre o ser e o não ser, fronteira que abandonamos pelo esquecimento conveniente, reconfigurado na ilusão dos dias e necessidade de continuarmos a ventilar o ar pesado que se abate pela espera incontornável do fim, para prosseguirmos no paradoxo entre a presença e a sua impossibilidade no tempo. A morte é uma ultrapassagem, antevisão fundamental que se retrai pela explosão do tempo consciente. Se por um lado todos os caminhos estão iluminados na sua validade e valoração perante o fim, são eles inconciliáveis com a sua interrupção eterna, que se abate pelo desfasamento da medida contínua das acções quotidianas, numa ameaçada racional e intrusa no curso individual e intransmissível. A morte é o destino de todos os homens, mas o destino dos homens não se reduz ao seu processo histórico e social, à sua função útil e finalidade colectiva, à maquinação dos desejos e quantificação dos gestos. Homem social e homem individual confrontam-se no avanço quotidiano repercutido no empenho e abandono vividos num processo de descontinuidade sentimental. Empenho e abandono são a síntese do processo existencial no tempo formador que impõe a realização alternada do “ser para morte”. Morrer no curso da existência é a garantia da finalidade humana, cumprida pelo aprofundamento da essência particular. Não é uma função biológica ou social, é uma pausa reflexiva que revela a unicidade individual e incomunicável, é uma morte relativa e provisória perante o final de uma etapa que sabemos acontecer um dia, e diante o qual resistimos intermitentes, dando conta do absurdo confronto entre a historicidade do ser e a sua superação pelo fim. Sem a morte as vivências percorreriam provavelmente um espaço vazio e infinito na falta de atrito temporal imposto por esse mesmo fim formador. Morremos essencialmente para continuarmos a pertencer às coisas na sua novidade. Morremos temporariamente no curso da existência como condição de revelação da essência impressa num código para além da história factual. É um lugar inefável onde se alcança a realidade inominada em sentido regressivo, que apaga os vícios da espécie e reinicia o fecundo e ingénuo desconhecimento.
P.A.
2 comentários:
Querido amigo
diz-me tu, que eu preciso de ouvir: em que acreditas tu em relação à tão perversa morte? Sinto que vives,tal como eu, com essa inevitabilidade a apertar-te o peito. O que te atormenta realmente? O medo de acabares, de deixares de ser pessoa, de deixares de ver, de respirar, de sentir, da não existência, do não seres jamais tu?... ...? Acreditas que não acabas realmente, que é só uma passagem para outra vida?
Eu não acredito em nada e isso apavora-me, muito mais que a própria morte. Sinto-me cobarde quando penso no medo que tudo isto me provoca. Serei realmente cobarde? Não sei, não sei! Os pensamentos surgem-me uns em cima dos outros, desordenados, febris. Serão tambem pensamentos destes, que surgem como bofetadas, que te impelem a escrever tão profundamente e tão acutilantemente sobre a morte? Percebo e sinto no mais fundo de mim tudo o que sentes e tudo o que escreves sobre o que sentes, já não confundiria as tuas reflexões escritas com as de ninguem. Estás ali: na forma, nos conteudos e principalmente, nas emoções provocadas pelas sensações que as pessoas e as "coisas" te causam. Se tivesse que arranjar um dos 5 sentidos para te definir, serias o tacto, tacteias a alma do ser Humano eximiamente, és o mago dos sentidos!
Admiro muito o que escreves e a sensibiliddade com que o fazes.
1 beijo
Sofia
Paulo
Devias responder às questões existenciais dos teus comentadores... Até era interessante estabelecer
aqui no teu blog,um local de "encontro" de todos aqueles que quiserem conversar sobre o q tu escreves e sobre os comentários em geral. Sem nos esquecermos das fotos, claro!
Um abraço
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